O novo iPad e o plano maquiavélico de Tim Cook
Por João VARELLA
Nos 15 anos em que esteve à frente da Apple, Steve Jobs transformou cada evento da empresa da maçã em um espetáculo midiático. Slides fantásticos, frases fortes pronunciadas no timing certo e magia tecnológica eram parte da fórmula para atiçar a cobiça por parte dos consumidores. Por essa razão era grande a expectativa pela estreia de seu sucessor, Tim Cook, no comando de seu primeiro show como CEO da Apple depois da morte de Jobs. A ocasião surgiu na quarta-feira 7, no Yerba Buena Center, em São Francisco. A expectativa aumentou porque era sabido que Cook apresentaria na ocasião uma nova versão do iPad, o badalado tablet da companhia.
No ataque: o CEO Tim Cook começa a mostrar sua marca
no comando da Apple.
Haveria alguma inovação fantástica em relação ao iPad 2? Algum recurso capaz de deixar a mídia, especialistas e os maníacos pela Apple de queixo caído? A curiosidade foi desfeita depois de Cook fazer um breve balanço do momento da companhia e tecer conjecturas sobre o que chamou de era pós-PC, o mundo dos dispositivos móveis conectados, como os tablets e smartphones. A reação inicial da mídia especializada internacional, no entanto, não foi das mais entusiasmadas. O Novo iPad, nome dado à terceira geração do tablet, não trouxe nenhum recurso revolucionário. Uma das melhorias é a câmera de 5 megapixels, bem superior ao modelo atual.
Mas o principal destaque mesmo é a Retina Display, um recurso que melhora de modo significativo a resolução da tela do tablet. No entanto, ao se analisar em detalhes o que cerca a chegada do Novo iPad, fica claro que a Apple ingressa agora, pelas mãos de Cook, num novo momento, e não por conta de algum recurso fenomenal. A questão é que, para defender seu território no mercado de tablets, ela decidiu partir para o ataque e fez recrudescer sua estratégia de centralizar as tecnologias em torno de seus aparelhos. Além disso, tenta fortalecer seu ecossistema de negócios, o que significa desfazer-se de antigos aliados e fazer afagos a possíveis parceiros de setores nos quais pretender ingressar.
Um exemplo do plano maquiavélico de Cook para manter a hegemonia da Apple é a entrada na disputa de um dos negócios mais apetitosos da tecnologia: o de videogames, um mercado de US$ 65 bilhões por ano. Assim, ela invade a praia do Xbox, da Microsoft; do Wii, da Nintendo; e do PS3, da Sony. O iPad foi apresentado quase como um console, com tela e processamento melhores que os aparelhos dedicados exclusivamente para games. Para demonstrar o poder de seu novo tablet, a Apple usou o jogo Infinity Blade: Dungeon. Pode parecer uma escolha aleatória, mas o recado tinha endereço certo: pisar no calo da Microsoft. Isso porque o jogo é da Epic Games, responsável pela franquia “Gears of War”, exclusiva do Xbox 360, da empresa de Bill Gates.
Mike Capps, presidente da Epic, é só elogios para o Novo iPad. Ele, porém, nem sempre foi um fã do iPad. Em abril do ano passado, o mesmo Capps afirmou que os aplicativos de US$ 1 iriam “matar a indústria dos games”. O comércio desse tipo de softwares foi consagrado pela Apple. Grande parte desses aplicativos foi desenvolvida por empresas pequeninas. Foi a esse batalhão de programadores que, no princípio do iPhone, a empresa pediu ajuda para rechear seu celular. Mas esse cenário mudou. Agora, a Apple está atrás dos grandes desenvolvedores de software. No caso do Novo iPad, por exemplo, a alta resolução de tela inviabiliza a participação nesse novo jogo dos pequenos programadores, que não têm bala na agulha para criar games sofisticados.
“A situação dos desenvolvedores com orçamento limitado é motivo de preocupação”, afirmou Peter Collier, fundador da Hogrocket, uma produtora inglesa, ao site pocketgamer.biz. O rol de novas alianças se estende à líder do mercado de locação online de vídeos, a Netflix. Cook anunciou uma parceria segundo a qual os usuários da locadora de vídeos vão poder assinar o serviço diretamente da Apple TV, com acervo de filmes em alta definição. Trata-se de um tapa na cara de Mark Zuckerberg, o fundador do Facebook. Isso porque Reed Hastings, o CEO da Netflix, é membro do conselho da rede social.
Jogos mortais: sucesso de mercado, o videogame Xbox 360, da Microsoft, está na mira do Novo iPad.
Outro alvo com a chegada do Novo iPad é o Google. No evento da semana passada, o tablet exibiu um serviço de mapa, mas não o do portal de buscas, como ocorria até o iPad 2. Isso indica que a Apple trabalha em um sistema de geoprocessamento para tirar o serviço do rival de seus aparelhos. O show de Cook também escancarou outra briga, desta vez, com os fabricantes de PCs. Um slide de sua apresentação mostrou que o iPad vendeu 15,4 milhões de unidades no último trimestre do ano passado e comparou com os resultados de venda de PCs da HP (15,1 milhões), Lenovo (13 milhões), Dell (11,9 milhões) e Acer (9,8 milhões).
Ao colocar na mesma balança computadores pessoais e o iPad, Cook quer provar que seu tablet pode suprir as necessidades dos consumidores. Além disso, a linha de produtos Apple é desenvolvida como um sistema fechado, que não se conecta com os PCs. Essa filosofia foi criada por Jobs. Uma de suas intenções com isso era se prevenir das derrapadas que os usuários pudessem cometer, afetando o desempenho dos equipamentos. Cook, por sua vez, reforçou esse mecanismo, mas utilizando-o com uma estratégia de negócios. Seu objetivo é tornar o usuário dependente do ecossistema Apple, dificultando assim sua ida para os braços dos rivais.
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